24 de novembro de 2009

Litoral

Pra começar vou abrir um leve assunto, citando um livro muito peculiar que acabou parando na minha estante da escritora chilena - e maravilhosa - Isabel Allende. O nome do livro é "Filha da Fortuna" e quanto mais eu leio, mais peculiar o modo dela de desenvolver a história me parece. Venho há alguns dias remoendo uma frase que mecheu muito comigo, e que deixei guardada pra lembrar de postar aqui quando desse. Lembrei - finalmente - e deixo aqui um pouquinho da poesia e peculiaridade que tanto me encantou.

" Com o passar dos anos, chegou à conclusão de que essa história não era de todo ruim: há uma certa poesia e um certo mistério naquilo que o mar nos devolve."
(diz ela referindo-se à dúvida que surge "de onde eu vim" quando pensa sobre o fato de ser adotada. ela fantasia ter sido parte do destroços de um navio na beira-do-mar, e ter sido achada na praia, no porto e depois entregue aos seus pais adotivos).

Há realmente uma certa poesia naquilo que o mar nos devolve. Estava revirando os livros da biblioteca lá da escola em um desses períodos inúteis que existem para serem ocupados com páginas de maravilhosa literatura, e eu fui atrás de algo um pouco mais empolgante. Adoro romances policiais, investigações, crimes, e logo fui para essa seção, onde acabei achando um que me pareceu mais cabível a leitura. "O Silêncio da Chuva" de um cara que eu não faço idéia de onde veio. O livro era bom, bem atípico para esse estilo policial, a história não tinha (pelo menos até o ponto que eu li) aquela continuidade que tanto nos deixa loucos para comer de colher o fim do livro. Mas isso não importa, na realidade o que me chamou atenção foi que o detetive responsável pelo assassinato do livro, o Espinosa (sim, nossa olha o nome do cara), sentava-se durante longos períodos na beira-do-mar. Olhando. A cidade do livro, era uma cidade portuária, e nesses locais costuma-se ter apenas bêbados, drogados, acompanhantes, e negociantes enfim. Ele conta que no começo todos olhavam-no com exagerada desconfiança. Mas depois todos acostumaram-se a sua presença. Ele, o detetive Espinosa, olhando para o mar. Sentindo o vento bater. Pensando. Daí eu fico imaginando aquela sensação maravilhosa que te arrepia de um jeito bom, de sentar e simplesmente ficar olhando a vida agir e as ondas quebrarem. Há quem pegue conchas na beira da praia, e quem não adora achar um brinco, ou pegar de volta um chinelo que o mar quis levar embora? (todo mundo já quase perdeu um chinelo assim) A maioria das pessoas pega conchas, brincos, chinelos e outras trivialidades que a nossa babaquice deixa escapar. Mas covenhamos que babaquice é não pegar o que o mar de tão livre e espontânea vontade te oferece. Espinosa pegava dicas, palpites, sentimentos, ele via as pessoas agindo no porto, vivendo. E assim se montava seu quebra-cabeça, que sempre está ligado ao nosso comportamento, pegava o vento para a solução de uma dúvida. E eu, o que eu pego na beira-do-mar?

Eu pego sentimentos da beira da praia. Eu pego tranquilidade, guardo nos bolsos muito carinho, e calço nos pés muita certeza de que esse é caminho que eu quero seguir. Alguns vão para a beira-do-mar pra procurar respostas, eu vou pra beira do mar pra escutar as perguntas que ele tem a me fazer. Eu vou pra procurar sentimento, poesia, e escutar o que o mar tem pra me dizer depois da noite passada. E o engraçado de tudo isso é que tem algo que o vento, e a beira-da-praia sempre me trazem.. Liberdade. Um sentimento de liberdade inexplicável, inextimável, que me faz sentir mais inteira. E mais solta, quase como se o vento pudesse me levar para uma ilha só minha em pleno mar aberto. O mar com suas ondas e profundezas, sempre tem algo a nos oferecer, a questão é se estamos prontos para deixá-lo.. falar.

(...) "há uma certa poesia e um certo mistério naquilo que o mar nos devolve."

Nenhum comentário: